sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

LIVRO: Esquerda Caviar, de Rodrigo Constantino




Terminei a leitura do livro “Esquerda Caviar”, de Rodrigo Constantino.
O autor tenta desnudar a mente daqueles ”inteligentinhos” da esquerda que vivem e defende os humildes, mas preferem a distancia deles, desfrutando dos benefícios que só o famigerado capitalismo pode oferecer.
Realmente é muito fácil defender os humildes desde que sentado em sua confortável sala, desfrutando do carro do ano, indo a bons restaurantes, viajando ao exterior com frequência, com os filhos matriculados na escola particular, sem precisar dos serviços dos serviços de saúde, segurança, educação e transporte públicos.
Eu admiro quem paga mais de duas vezes (impostos + contratação de serviços particulares) sem reclamar, feliz e satisfeito, por querer crer que está sendo feita justiça social, por crer que o Estado Robin Hood é capaz de bem empregar o que ele tira da classe média e diz distribuir entre os pobres.
Voltando à obra, é uma mera tentativa, pois o autor, apesar de trazer à tona a verdade da hipocrisia do grupo que ele denomina de “esquerda”, utiliza a mesma técnica de discurso, a mesma retórica, do grupo que condena, cheia de lugares comuns, preconceitos, agressões.
Em algum lugar (nem lembro se foi nesta obra) eu li que os americanos – e ele idolatra os americanos – discutem ideias e não intimidades, o que os tornou melhores no discurso político. Aí eu me pregunto: porque o autor resolveu partir para o ataque pessoal em vez de discutir ideias?
Sabemos que estamos em um mundo onde o politicamente correto tomou conta das mentes brilhantes. Quem não for politicamente correto hoje em dia corre o risco de ser execrado em vias públicas. Ai de quem disser que um afrodescendente é negro ou preto. Mas isso não muda o tom da pele de ninguém. Homossexualismo -> homossexualidade -> homoafetividade. Mas os gays não vão deixar de amar alguém do mesmo sexo por uma mudança de sufixo. Um “sistema que não funciona” passou a ser um “sistema em constante processo de aperfeiçoamento”. Risos! Transporte público virou mobilidade urbana, mas as dificuldades do usuário continuam as mesmas. Mal educado virou bipolar. Feminismo, machismo, sexismo, futebolismo, religiosismo, blá, blá, blá, blarrrghhh...
O problema da humanidade é justamente o que um dia foi solução. A ciência se desenvolveu quando começamos a classificar as coisas e colocarmos em suas caixinhas. O problema é o exagero. Tem coisas e conceitos no mundo que não cabem em gavetas. Tal é o exagero, que a guerra se faz. Principalmente quando a exacerbação transforma o mundo num grande jogo de binários (pretos x brancos, homo x hétero, machos x fêmeas, esquerda x direita, religiosistas x ateus...).  Desenvolveram-se polaridades até mesmo de uma mesma caixinha, afinal é comum ver religiosistas brigando entre si em vez de pregar a paz mundial... Cristãos brigando por poder em vez de unirem forças em prol dos valores fundamentais de seus credos...
Acho que já deu dessa presepada, né? É muito grave esse reducionismo superficial do mundo em pares, em caixinhas. E o autor não aprofundou nessa questão, mas sim criticou figuras públicas, muitas vezes com as mesmas ofensas pessoais e exageros que tanto atribuiu ao seu alvo de condenação. Não creio que, para discordar de algo ou alguém, seja preciso ficar parecido com o alvo. Infelizmente o autor cometeu esse erro. Antes de discutirmos ideais, precisamos voltar a discutir valores, pois nos esquecemos deles quando passamos a discutir as ideias.
É grave classificarmos as pessoas e coisas a partir de uma característica. Superficial. Perde-se a essência. Negros, brancos, pobres, ricos, heterossexuais ou não, direitistas e esquerdistas, machos ou fêmeas, somos humanos. Sempre haverá diferenças. Afinal, a diferença é a característica que mais nos torna iguais. E deveríamos lidar somente com aquelas que realmente nos impulsiona a um futuro melhor. Algumas diferenças são naturais, impossíveis de eliminar, mas possíveis de se respeitar. As que não são naturais teriam um tratamento mais adequado se muitas delas fossem simplesmente ignoradas. E as que sobram são aquelas importantes, que realmente prejudicam as pessoas, que devem ser tratadas com mais atenção.
Mas vale a leitura, que é agradável e engraçada em alguns pontos. Vale também por ter deixado a hipocrisia exposta: sua crítica expôs a hipocrisia da esquerda, e sua retórica expôs a própria hipocrisia (ele se diz de direita, liberal). Se é que é possível dizer, ao menos no Brasil, diante de tantos projetos políticos vagos e pessoais, que exista essa divisão ideológica.
Vale por provocar a reflexão.
Não sou economista, nem cientista político, não entendo patavinas, nem quero entender. Sou apenas cidadão. Mas, estou com a Miriam Leitão no que se refere ao tratamento das divergências, principalmente por sermos todos vítimas dessas visões reduzidas e tirânicas sobre as coisas do mundo:
“Bom é quando os jornalistas divergem e ficam no campo das ideias: com dados, fatos e argumentos.
Isso ajuda o leitor a pensar, escolher, refutar, acrescentar, formar seu próprio pensamento, que pode ser equidistante dos dois lados. O que tem feito falta no Brasil é a contundência culta e a ironia fina. Uma boa polêmica sempre enriquece o debate. Mas pensamentos rasteiros, argumentos desqualificadores, ofensas pessoais, de nada servem. São lixo, mas muito rentável para quem o produz.”
O autor aponta várias caricaturas do que ele denomina esquerda. De Obama a Luciano Huck. Mas, se for possível apontar uma caricatura de direita, ela será o Rodrigo Constantino.

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